Medida do Ministério do Meio Ambiente reacende debate entre preservação da biodiversidade e impactos econômicos para o setor aquícola
A produção de tilápia, uma das mais importantes atividades da aquicultura nacional, pode estar com os dias contados no Brasil. Uma proposta apresentada pela Comissão Nacional de Biodiversidade (Conabio) — vinculada ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) — sugere incluir a tilápia na Lista Nacional de Espécies Exóticas Invasoras, o que pode levar à proibição de seu cultivo em todo o território nacional.
A minuta da proposta foi apresentada no dia 3 de outubro, durante reunião do Conselho Nacional de Aquicultura e Pesca (Conape), e inclui também outras espécies não nativas do país. A votação está prevista para o dia 9 de novembro, e já mobiliza especialistas, ambientalistas e representantes do setor produtivo.
Por que a tilápia é considerada uma ameaça ambiental
Originária do continente africano, a tilápia foi introduzida no Brasil na década de 1970 com autorização do Ibama, sob regime de licenciamento ambiental, e rapidamente se tornou a espécie mais cultivada no país. No entanto, pesquisadores alertam que, em caso de fuga dos criadouros, o peixe pode causar sérios desequilíbrios nos ecossistemas aquáticos.
Por se reproduzir de forma acelerada e competir com espécies nativas por alimento e espaço, a tilápia ameaça a sobrevivência de peixes menores e pode alterar a cadeia trófica dos rios e represas. Além disso, a ração utilizada na produção intensiva é rica em fósforo e nitrogênio, o que contribui para a eutrofização — processo que causa proliferação de algas e deteriora a qualidade da água.
Um relatório do MapBiomas Água (2023) identificou sinais de degradação ambiental em áreas próximas a grandes reservatórios, como o de Itaipu, em decorrência do despejo de ração e dejetos das pisciculturas.
Impactos econômicos e sociais
A possível proibição preocupa produtores e entidades do setor, já que o Brasil é o quarto maior produtor mundial de tilápia e o maior da América Latina. Segundo levantamento do BNDES e da Embrapa, a espécie responde por 52% de toda a aquicultura nacional e é responsável por movimentar bilhões de reais na economia.
Em 2023, a atividade gerou uma receita de R$ 10,2 bilhões, e em 2024 o país produziu 662 mil toneladas do peixe, o equivalente a 68% da piscicultura nacional, segundo dados da Peixe SP — Associação de Piscicultores em Águas Paulistas e da União.
Marilsa Patrício Fernandes, secretária executiva da entidade, reconhece a importância da proteção ambiental, mas alerta para o risco de uma decisão precipitada:
“Classificar a tilápia como espécie invasora, no contexto de uma atividade licenciada e tecnificada, constitui um equívoco de graves consequências socioeconômicas, sem representar solução efetiva às questões ambientais”, afirmou em nota.
Desafio entre sustentabilidade e economia
O debate sobre o futuro da tilápia expõe um dilema central entre preservar a biodiversidade brasileira e manter o equilíbrio econômico de uma cadeia produtiva que envolve milhares de famílias, cooperativas e pequenas indústrias em todo o país.
Enquanto ambientalistas defendem medidas mais rigorosas de controle e incentivo à criação de espécies nativas — como o tambaqui e o pintado —, o setor produtivo alega que a proibição da tilápia representaria um retrocesso econômico e ameaça à segurança alimentar.
A decisão da Conabio, prevista para novembro, promete ser um marco na política ambiental brasileira — e pode redefinir o rumo da piscicultura nacional.