Iniciativa quer criar regras mínimas e um painel científico internacional para monitorar o uso e o impacto da IA no mundo
A Organização das Nações Unidas (ONU) deu um passo histórico nesta quinta-feira (3/10) ao lançar o Diálogo Global sobre Governança da Inteligência Artificial, um fórum internacional que pretende criar um conjunto mínimo de regras e mecanismos de cooperação entre países para lidar com os riscos e desafios da IA.
O anúncio foi feito em Nova York pelo secretário-geral António Guterres, que defendeu uma “governança global inclusiva e equilibrada”, capaz de garantir que os benefícios da tecnologia sejam compartilhados sem comprometer direitos humanos, segurança e soberania digital.
O fórum vai reunir governos, cientistas, empresas e representantes da sociedade civil, com encontros oficiais marcados para Genebra (2026) e Nova York (2027).
Em paralelo, será criado um painel científico independente — comparável ao IPCC do clima — formado por 40 especialistas, entre eles dois co-presidentes (um de país desenvolvido e outro de país em desenvolvimento).
Segundo Guterres, a IA oferece “oportunidades imensas, mas também perigos inéditos”, e exige respostas coletivas.
“Nenhuma nação, por mais avançada que seja, pode enfrentar sozinha os riscos da inteligência artificial. Precisamos de cooperação e transparência”, afirmou.
Uma tentativa de frear a corrida tecnológica
Nos últimos dois anos, potências como o Reino Unido, a Coreia do Sul e a França realizaram cúpulas sobre IA, mas sem resultados concretos. O novo fórum da ONU é visto como o esforço mais ambicioso até agora para conter o avanço desregulado da tecnologia.
Para Isabella Wilkinson, pesquisadora do instituto britânico Chatham House, a criação desses órgãos representa “um triunfo simbólico” e a “abordagem mais inclusiva já proposta”.
No entanto, ela alerta que a burocracia da ONU pode não acompanhar a velocidade da evolução tecnológica, tornando as decisões lentas ou ineficazes.
Um tratado global sobre IA?
A expectativa é que o fórum avance para um acordo internacional vinculante, semelhante aos tratados que proibiram testes nucleares e armas biológicas.
O renomado professor de ciência da computação Stuart Russell, da Universidade da Califórnia, defende que governos adotem “linhas vermelhas” até o fim de 2026, com regras que obriguem empresas de tecnologia a comprovar a segurança de seus sistemas antes da liberação comercial.
“Assim como fazemos com medicamentos ou usinas nucleares, podemos exigir que desenvolvedores provem a segurança como condição de acesso ao mercado”, explicou Russell.
Entre as propostas em discussão está a criação de uma “convenção-quadro” internacional, nos moldes da Organização Internacional de Aviação Civil (OACI), que estabelece padrões globais de segurança e pode ser atualizada conforme os avanços tecnológicos.
Com a iniciativa, a ONU tenta se posicionar como árbitra global da revolução da inteligência artificial, buscando equilibrar inovação e segurança num campo que já redefine a economia, o trabalho e até a política mundial.