Pesquisadoras citam falta de políticas públicas para efetividade da legislação
Os números do último Anuário de Segurança Pública, divulgado recentemente, revelam um cenário preocupante no combate à violência doméstica contra mulheres no Brasil. Apesar de contar com uma legislação considerada exemplar, a Lei Maria da Penha, que completa 19 anos nesta quinta-feira (7), os crimes relacionados à violência de gênero não diminuíram — e, em alguns casos, aumentaram.
A Lei Maria da Penha foi um marco na proteção dos direitos das mulheres, instituindo medidas protetivas urgentes e ações integradas para prevenir agressões. No entanto, sua efetividade depende da implementação de políticas públicas que garantam o funcionamento das redes de apoio e fiscalização.
Segundo dados do Anuário, a cada dia, são registrados quatro feminicídios e mais de dez tentativas de assassinato. Em 80% dos casos, o agressor é companheiro ou ex-parceiro da vítima. Um dado alarmante revela que, nos últimos dois anos, 121 mulheres foram assassinadas mesmo estando sob medida protetiva de urgência, o que expõe a dificuldade do poder público em garantir a proteção necessária.
A pesquisadora Isabella Matosinhos, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, reforça que as medidas protetivas, embora rápidas e potencialmente salvadoras, mostram falhas na fiscalização e na prevenção efetiva. “Precisamos olhar com rigor para os casos em que a medida protetiva é descumprida, para evitar novas tragédias”, alerta.
O atendimento integrado entre saúde, assistência social e segurança pública, previsto na lei, enfrenta desafios para funcionar de forma articulada, principalmente em cidades do interior. A pesquisadora Amanda Lagreca, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), destaca que é fundamental investir na implementação dessas redes, considerando as particularidades locais.
A violência de gênero atinge mulheres de todas as regiões e classes sociais, mas afeta com mais intensidade as mulheres negras — que representam 63,6% das vítimas — e as faixas etárias entre 18 e 44 anos.
Para além da legislação, especialistas ressaltam a necessidade de ações educativas e de mudança cultural para prevenir a violência. A Lei Maria da Penha também reconhece a violência psicológica como forma de agressão, ampliando o escopo da proteção.
Amanda Lagreca enfatiza a importância da conscientização nas escolas e em espaços educativos para que meninos e jovens aprendam a rejeitar toda forma de violência contra a mulher.
A Lei Maria da Penha é reconhecida internacionalmente pela ONU como uma das legislações mais avançadas para o enfrentamento da violência contra a mulher, mas sua eficácia depende do compromisso contínuo da sociedade e do poder público.